Exibição:
10/01/1979 (RTP 1)
Número de programas:
01
Programa de:
Vítor Pavão dos Santos
Jorge Listopad
Produção e realização:
Jorge Listopad
Elenco:
Fernanda Borsatti
Fernando Heitor
Helena Isabel
Lia Gama
Rui Mendes
Virgílio Castelo
Exibição:
10/01/1979 (RTP 1)
Número de programas:
01
Programa de:
Vítor Pavão dos Santos
Jorge Listopad
Produção e realização:
Jorge Listopad
Elenco:
Fernanda Borsatti
Fernando Heitor
Helena Isabel
Lia Gama
Rui Mendes
Virgílio Castelo
Isto Agora É Outra Loiça descrito, à data, pelo seu autor, Vítor Pavão dos Santos:
O teatro de revista, desde que apareceu, por meados do século passado, tem sido sempre um teatro onde se comenta o dia-a-dia, onde os acontecimentos do quotidiano são passados em revista, à mistura com piadas e cantigas. E tão persistente tem sido a revista em comentar a vida portuguesa, que se poderia fazer uma história dos nossos últimos cem anos através do teatro de revista. Foi pegando nesta ideia que resolvemos agarrar em determinados períodos da vida portuguesa e mostrar como é que a revista os viu.
Para começar esta série de programas, que se chama Isto Agora É Outra Loiça, vai mostrar-se um pouco da revista durante o salazarismo. Trata-se de uma época dura para a revista, e não só para a revista, como se sabe. Uma época em que uma censura forte e estúpida não deixava que quase nada se dissesse. Mas uma época em que a revista, contando com a colaboração de grandes artistas, conseguiu, umas vezes melhor, outras pior, iludir essa censura e continuar a comentar a vida portuguesa. E isto porque esses grandes artistas tinham uma tal comunicação com o público que, através de subentendidos e piscadelas de olho, faziam chegar até ele aquilo que a censura lhes proibia.
Esta primeira série de três programas foca o período da Guerra Mundial, ou seja os anos de 1939 a 1945. Para recriar o trabalho desses grandes artistas, como Estevão Amarante, Vasco Santana, António Silva, Mirita Casimiro, Hermínia Silva, Luísa Satanela, Costinha, Teresa Gomes, Irene Isidro, Álvaro Pereira, e outros, formou-se uma equipa de artistas, alguns deles sem nenhuma experiência revisteira, mas todos interessados na revista e na história desse tempo: Rui Mendes, que faz o compère e situa cada um dos números apresentados, Lia Gama, Fernanda Borsatti, Helena Isabel, Fernando Heitor, Manuel Cavaco e Virgílio Castelo.
Não pretendemos, de modo algum, imitar esses grandes e inimitáveis artistas, mas sim mostrar como eles comentaram a vida portuguesa através da revista. É portanto, um programa que pretende divertir, com números engraçados e cantigas animadas e famosas. Mas que pretende também, além de divertir, mostrar um pouco da vida portuguesa. Para que, recorrendo à memória da revista, as pessoas se lembrem desses tempos. Demos portanto a palavra à revista. Vamos rir e cantar com ela. Mas vamos também pensar nas coisas que ela nos conta. Coisas não foram nada boas. Coisas que não voltarão nunca mais a acontecer, se todos nós quisermos e tivermos boa memória.
Vítor Pavão dos Santos
Antes ainda de surgir o projeto para este programa, já Vítor Pavão dos Santos dissecara a história da Revista desde as suas origens até aos finais dos anos sessenta, de modo a completar uma obra que o semanário O Jornal lançou em 1978.
A ideia para Isto Agora É Outra Loiça nasceu numa conferência que Vítor Pavão dos Santos fez, a convite da Sociedade Portuguesa de Autores, num ciclo dedicado à Revista Portuguesa. O autor queria falar o menos possível e deixar que a revista falasse por ela. Reuniu, então, um grupo de atores amigos que se encarregaram dos números, e apenas teve de fazer umas breves introduções para situar o assunto na época. Jorge Listopad foi assistir e propôs à televisão uma coisa desse tipo para uma série de programas.
Na versão televisiva, os números eram introduzidos pelo compère Rui Mendes.
“Isto agora é outra loiça” era o célebre refrão da cantiga D. Chica e Sr. Pires, criada, em 1929, na revista Pó de Maio, por Beatriz Costa e Álvaro Pereira. Foi também este o tema escolhido para o genérico do programa.
A maior curiosidade sobre Isto Agora É Outra Loiça diz respeito à sua duração efémera. Estava prevista a realização de cerca de 12 programas mas, exibido o primeiro, logo Isto Agora É Outra Loiça foi suspenso. Na base desta decisão, terá estado algum incómodo causado pelo facto de o programa retratar a época salazarista.
Para se justificar, a administração da RTP emitiu um despacho, que foi lido perante as câmaras e que dizia:
A exibição do 1.º programa da série Isto Agora É Outra Loiça, que teve lugar em 10 do corrente mês, suscitou, por um lado, críticas unanimemente favoráveis e, por outro, reparos de alguns espectadores, intérpretes, autores e empresários teatrais.
Deseja-se uma televisão viva, discutida, controversa, sobretudo – e como é o caso – na área da programação cultural. De outra forma, se seguir outro sentido, a RTP não estará, como também lhe compete, a participar na transformação das ideias do nosso povo. Transformação que está indissoluvelmente ligada com as modificações sociais, económicas e culturais de que o país carece e para que a constituição aponta.
Daí que seja particularmente difícil assegurar, num regime democrático, um serviço público de televisão que não colida, muitas vezes, com as preferências alienantes e acomodatícias de certos públicos ou com os interesses de certos grupos e que, por outro lado, desempenhe o seu papel de moderador de novos comportamentos da sociedade a que se destina.
Trata-se de um problema complexo, pouco estudado entre nós, que exige muita reflexão e prudência, até porque é, em si mesmo, gerador duma grande instabilidade na relação entre a televisão e os seus utentes.
Acresce que no caso em referência, o programa Isto Agora É Outra Loiça, surgiram, para além das reclamações supracitadas, questões de fundo em matéria de direito autoral que estão, neste momento, a ser reequacionadas entre a RTP e a Sociedade Portuguesa de Autores.
Enquanto decorrerem tais negociações, cuja conclusão se estima para a 1.ª semana de Fevereiro, ficam suspensas as emissões e os trabalhos de produção deste programa.
Solicitado a dar uma opinião sobre o caso, Vítor Pavão dos Santos assinalou: “Isto Agora É Outra Loiça foi pensado como um programa cultural de caráter histórico, na convicção de que é possível escrever a história de Portugal nas últimas décadas através da revista. A primeira série, com três programas, visava aspetos do período salazarista de 1939 a 1945. Durante esse período, Salazar era, naturalmente, a figura mais visada no teatro de revista, até porque era, de facto, a figura mais importante do regime. Foi, portanto, com estranheza que recebi a informação de que ficavam suspensas as emissões e os trabalhos de produção do programa”.