Roque Santeiro

Exibição:
12/10/1987 – 03/08/1988 (RTP 1)

Número de capítulos:
209

Produção:
Rede Globo (1985/1986)

Novela de:
Dias Gomes

Escrita por:
Dias Gomes
Aguinaldo Silva

Direção:
Paulo Ubiratan
Gonzaga Blota
Jayme Monjardim
Marcos Paulo

Asa Branca é uma pequena cidade que prosperou muito nos últimos dezassete anos graças à exploração de um mito: o mito de Roque Santeiro (José Wilker), considerado santo e mártir pelo povo e pelos peregrinos que vêm de longe à procura de um milagre. Remonta a história ao momento em que Asa Branca foi invadida pelo bandido Navalhada (Oswaldo Loureiro). Numa tentativa de defender a cidade, Roque Santeiro teria sido assassinado e, dias depois, o seu corpo encontrado sem cabeça num rio, cuja lama passou a curar várias doenças. Com o passar do tempo, a cidade desenvolveu-se, sendo dominada pelo latifundiário Sinhozinho Malta (Lima Duarte), que mantém um romance com Porcina (Regina Duarte), viúva de Roque.

Sinhozinho Malta e Viúva Porcina

No momento em que Asa Branca atinge o auge da prosperidade, chega um forasteiro em busca do padre Hipólito (Paulo Gracindo). Esse sujeito é na verdade Roque Santeiro, que não morreu nem defendeu a cidade. O seu desaparecimento deve-se ao facto de ter roubado o ostensório desaparecido da igreja e, agora, depois de enriquecer no estrangeiro, vemo-lo de volta à terra natal para o devolver.

Roque Santeiro

Ao saber disto, Sinhozinho Malta entra em pânico. Se Roque não morreu, a cidade de Asa Branca está condenada à falência, pois o seu progresso deve-se única e exclusivamente ao turismo religioso. Ficamos a saber que Porcina nunca foi casada com Roque: a suposta viuvez tratou-se do melhor expediente que Sinhozinho encontrou para a ter por perto sem despertar suspeitas. Por conseguinte, os poderosos de Asa Branca, que são Sinhozinho, o prefeito Flô (Ary Fontoura) e o comerciante Zé das Medalhas (Armando Bógus), resolvem fazer um acordo e decidem que Roque Santeiro deve permanecer morto. Como o visado se recusa a sair da cidade, todos lhe pedem que permaneça escondido em nome do bem comum. Porém, a presença de Roque começa a transformar-se num grande perigo: várias pessoas descobrem a sua identidade e a solução é calarem-se ou sujeitarem-se a ser assassinadas.

Roque Santeiro: o mito em forma de estátua

Ao cabo de uns meses, Sinhozinho é perentório: há que dar cabo do falso santo antes que ele dê cabo da cidade. O atentado, porém, não é bem sucedido e Roque, acolhido por Porcina, que agora se encontra verdadeiramente apaixonada por ele, avisa ter um dossier onde conta toda a verdade, dossier que será publicado se lhe acontecer alguma coisa. Para complicar o problema, outro elemento estranho aporta em Asa Branca: é o bandido Navalhada, agora um fanático religioso, convencido de que o demónio encarnou na figura de Roque Santeiro. Não demora muito tempo para que os dois fiquem frente a frente. Navalhada recusa ouvir os argumentos de Roque e dispara sobre ele. Roque atira em legítima defesa e, escondido, Sinhozinho dispara ao mesmo tempo sobre o ex-bandido, acertando em cheio.

Convencido de que matou Navalhada, e tendo que escolher entre enfrentar a polícia e deixar a cidade, Roque opta pela segunda alternativa, com o apoio de todos aqueles que sempre o quiseram ver longe. Porcina promete acompanhá-lo na viagem, mas à última hora desiste, ficando com Sinhozinho, com quem sempre se identificou. E o inexplicável aparecimento do corpo de Navalhada é explicado como mais um milagre…

Sinhozinho, Porcina e Roque: triângulo amoroso

Um extraordinário sucesso de audiências como raramente se viu em mais de cinquenta anos de televisão.

A estreia de Roque Santeiro foi agendada para 12/10/1987, numa altura em que há quase um ano não era exibida uma telenovela da Globo no horário noturno.

O sucesso surgiu logo desde o início, o que levou ao lançamento da revista Contigo! portuguesa, que trazia vastas matérias sobre Roque Santeiro. A Contigo! ainda se manteve alguns meses após o término da telenovela, com artigos de grande destaque alusivos a Selva de Pedra, mas acabou por sair discretamente do mercado no início de 1989.

Aliás, toda a imprensa também correspondeu às preferências dos telespectadores, sendo frequente encontrar-se nos jornais e revistas várias páginas com curiosidades sobre Roque Santeiro.

Soube-se, por exemplo, que a telenovela era vista por várias personalidades do meio político português, como Mário Soares, António Guterres, Francisco Louçã e Carlos Carvalhas.

Se7e apresentou uma reportagem sobre a controversa abertura de uma boîte na vila de Borba. O jornal registou o desagrado do pároco local e entrevistou igualmente um dos sócios do estabelecimento, que afirmou que também em Borba existia uma “Dona Pombinha”. Recorde-se que, anos mais tarde, Borba voltou a estar no centro de uma polémica, quando os pais da concorrente Margarida apareceram em direto no Bar da TV, exigindo que a filha abandonasse o programa.

Em dezembro de 1987, no dia em que ia ao ar o capítulo 51, a locutora Helena Ramos apareceu às 20 horas e 12 minutos, a anunciar que não íamos ver esse capítulo porque o mesmo não existia, coisa rara de acontecer, já que são poucas as irregularidades na numeração ao longo de trinta décadas de telenovelas. Assim, para quem não sabia, o capítulo 52 começa onde acaba o capítulo 50. Este é o primeiro capítulo que não foi escrito por Dias Gomes e talvez, à data, tenha sido feito um acerto, pois na sua versão original Roque Santeiro conta com dois capítulos n.º 3.

Helena Ramos no dia 22/12/1987

Entretanto, foram bastantes os produtos à venda alusivos a esta telenovela, a começar por uma coleção de calendários, editada pela Impala e posta à venda nas bancas.

Existiram outras coleções de calendários, vendidas em feiras e romarias, uma das quais trazia, no verso dos calendários, “publicidade” à fábrica de velas Linda Bastos, da propriedade de Tito Moreira França (Luiz Armando Queiroz).

No que respeita à banda sonora, foi lançado, inicialmente, um LP cuja capa era igual à do primeiro volume da banda sonora vendido no Brasil.

SEM PECADO E SEM JUÍZO – Baby Consuelo
CORAÇÃO APRENDIZ – Fafá de Belém
SANTA FÉ – Moraes Moreira
A HORA E A VEZ – Cláudio Nucci e Zé Renato
COISAS DO CORAÇÃO – Ritchie
FRUTA MULHER – Nana Caymmi
MIL E UMA NOITES DE AMOR – Pepeu Gomes
INDECENTE – Anne Duá
MISTÉRIOS DA MEIA-NOITE – Zé Ramalho
A OUTRA – Simone
PELO SIM PELO NÃO – Cláudio Nucci e Zé Renato

Posteriormente, surgiu um outro LP contendo novas músicas, intitulado Os melhores temas de “Roque Santeiro”.

ROQUE SANTEIRO – Sá e Guarabyra
CHORA CORAÇÃO – Wando
DE VOLTA PRO ACONCHEGO – Elba Ramalho
MALANDRO SOU EU – Beth Carvalho
VITORIOSA – Ivan Lins
DONA – Roupa Nova
VERDADES E MENTIRAS – Sá e Guarabyra
ISSO AQUI TÁ BOM DEMAIS – Dominguinhos c/ Chico Buarque
MAL NENHUM – Joanna
ENTRA E SAI DE AMOR – Altay Velloso

As músicas que compunham os dois volumes da banda sonora original no Brasil foram distribuídas de forma aparentemente aleatória entre estes dois discos. De fora, ficaram três temas:

CÓPIAS MAL FEITAS – Alceu Valença
AMPARITO AMOR – Cauby Peixoto
MAL DE RAIZ – MPB-4

Foram ainda lançados vários singles com alguns dos temas da novela.

As cassetes piratas também tiveram o seu papel, uma delas trazendo na capa a fotografia do segundo álbum editado no Brasil, em 1985.

Era também possível encontrar à venda uma cassete com músicas que, ao contrário do que era habitual, não eram falsificações das versões originais, mas sim composições inéditas que, só pelo título, já aguçavam a curiosidade do ouvinte. Para a capa desta cassete, foi utilizada a imagem de um calendário pertencente a uma das coleções existentes.

ESTOU CERTO OU ERRADO
OH SANTINHA
O SANTO VOLTOU
A HORA DO SERÃO
O ROCK SANTEIRO
JÁ VENDIAM DEVOÇÃO
SÓ FALAM SANTEIRO
PORCINA GOLPISTA

Nesta época, Nuno da Câmara Pereira lançou um single com a sua própria versão de De volta pró aconchego.

Por sua vez, os Onda Choc incluíram, no álbum Vem dançar, uma adaptação do tema Roque Santeiro, de Sá e Guarabyra, intitulada Vou pedir a Roque Santeiro.

Embora importados do Brasil, o mercado português também teve acesso a uma caderneta de cromos com fotografias e caricaturas de quase todas as personagens, bem como um livro que contava a história da novela do princípio ao fim. Este livro foi o primeiro da coleção Campeões de Audiência, que traria, no decorrer de 1988, outros volumes com o enredo de grandes sucessos bastante conhecidos do público português, como Guerra dos SexosÁgua VivaPai HeróiDancin’ days.

Tal como O Bem-amadoRoque Santeiro é baseada numa peça de Dias Gomes, O Berço do Herói, que foi durante vários anos proibida pela censura da ditadura militar brasileira. A ideia de a adaptar para televisão já remontava a 1975 e a telenovela chegou mesmo a ser anunciada, tendo sido gravados os primeiros capítulos. Todavia, ao ser escutada uma conversa telefónica do autor, que revelava a fonte de inspiração da história de Roque, os agentes da censura federal proibiram a exibição e o projeto ficou adiado por dez anos.

Porcina (Betty Faria) e Sinhozinho Malta (Lima Duarte) na 1.ª versão

Lima Duarte e Regina Duarte deslocaram-se a Portugal por essa altura e foram recebidos por várias figuras conhecidas do panorama artístico português, onde se destacam Eunice Muñoz e Herman José. Convidados especiais do concurso Com Pés e Cabeça, representaram um pequeno sketch, interpretando as personagens Porcina e Sinhozinho Malta.

Por essa ocasião, também foram ao Porto e, no restaurante Casa Branca, voltaram a encarnar as personagens da telenovela. Existe aliás, à entrada, uma coleção de fotografias com os convidados ilustres, em que os vemos em cena.

Eloísa Mafalda também apareceu vestida de Pombinha, fora da telenovela, fazendo promoção a um conhecido óleo de cozinha.

A mesma Eloísa Mafalda deu os parabéns à RTP pelo seu 31.º aniversário, em março de 1988. Outros atores que emitiram as suas mensagens de felicitações foram Paulo Gracindo e Cláudia Raia, que descreveram os seus papéis nas telenovelas que estavam então a gravar, Mandala Sassaricando respetivamente.

Roque Santeiro foi tema de conversa não só na vida real como em programas de ficção:

– Em Duarte & C.ª, um assalto à casa de Lúcifer é planeado à hora da telenovela, para garantir que os bandidos estarão entretidos e serão facilmente aniquilados. Durante a cena, é possível ouvir um diálogo entre Lulu e o Padre Hipólito.

– No primeiro capítulo de Passerelle, Armando (Júlio César) está a ler o jornal e comenta que “morreu o Zé das Medalhas”.

– Em Sétimo Direito, Henrique Santana, autor e intérprete da série, mostrou ser um grande admirador de Roque Santeiro, já que foram várias as referências à novela. Num dos episódios, a família Pimentel encontra-se a assistir com interesse a um capítulo da novela. Em outra ocasião, quando os moradores do prédio estão a encenar uma tragédia grega e se fala numa serpente alada, Alberto comenta que “a serpente de Asa Branca era a Dona Pombinha”. Por diversas vezes, também profere uma frase que era frequentemente dita por Sinhozinho Malta: “Eu não sei de nada, não me digue nada!”

– Também em Lá Em Casa Tudo Bem, que foi ao ar ao mesmo tempo que Roque Santeiro, são feitas algumas alusões às personagens da telenovela de Dias Gomes.

– No telefilme Corações Periféricos: a mulher de Tony (João Cardoso) assiste a um capítulo da novela.

Em julho de 1988, Cláudio Cavalcanti chegou a Portugal, juntamente com Gracindo Jr. e Maria Lúcia Frota. Os três estiveram em cena com a peça Obrigado pelo amor de vocês, que chegou a ser transmitida pela RTP.

O último capítulo de Roque Santeiro foi exibido no dia 03/08/1988, tendo repetido no dia seguinte.

A telenovela veio a repetir mais tarde na SIC, em 1993, tendo estreado às 18:05. Posteriormente, passou a dar uma hora mais cedo, faixa horária em que se manteve até ao final. Para este efeito, foi comprada uma versão de 180 capítulos de 45 minutos, que foram distribuídos em episódios de duração variável, como é comum ocorrer com as telenovelas em exibição neste canal. Registe-se que o “último capítulo” teve duração inferior a 15 minutos, abrangendo apenas as derradeiras cenas, uma vez que o restante já havia sido exibido no dia anterior.

Roque Santeiro foi novamente transmitida em 2001, pelo canal GNT, às 20 horas em ponto, tendo sido comercializado um CD com os principais temas desta produção.

O sucesso da primeira exibição ainda hoje é lembrado como um ponto alto dos anos 80, o que motivou uma festa temática na passagem de ano de 2009 para 2010.

Em 2010, Roque Santeiro é a primeira novela a ser lançada em DVD no Brasil, numa edição comemorativa do seu 25.º aniversário. Trata-se de um compacto em 16 discos, com duração total de 51 horas.

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